Em 2001 existiam na cidade de Boa Vista 35 gangues urbanas, conhecidas pela prática de atos violentos, disputas territoriais e envolvimento com o tráfico de drogas. Conhecidas como “galeras”, eram integradas por jovens, a maioria moradores de regiões de alta vulnerabilidade social. A partir de um amplo diagnóstico socieconômico, que abrangeu todo o município, os números da violência tornaram-se nomes, rostos, endereços e ganharam uma explicação: a situação de pobreza e indigência em que viviam cerca de 17 mil adolescentes.
Para mudar tal situação, a Prefeitura Municipal foi em busca desse público em ações como o “Esporte noite a dentro”, atividades noturnas nas regiões em que as galeras atuavam. Essas noites marcaram o início do contato entre os gestores e os adolescentes e estabeleceram os alicerces principais do projeto Crescer: a confiança e o acolhimento.
“No início, eles chegaram a se esfaquear na minha frente. Em um determinado momento, me entregaram as armas. Pedi a um desses garotos para sentar na minha mesa e ouvir todos os problemas da cidade. Criamos com eles uma relação de respeito, algo que eles não tinham por ninguém”, conta a Prefeita Teresa Surita, criadora do projeto junto ao gestor Moacir Collini.
“Em 2001, as pessoas ainda não compreendiam a importância desse trabalho. Quando o projeto foi interrompido, a violência voltou, e a sociedade, que era contra, passou a pedir o retorno do Crescer”, acrescenta a prefeita, que reconhece que enfrentar a violência juvenil é “colocar o dedo na ferida”.
Em 2004, foi criada a Escola Frei Arthur, que passou a abrigar todas as aulas oferecidas pelo projeto. As aulas, distribuídas em uma grade estruturada, incluíam oficinas de artes plásticas, moda, música, xadrez e cursos profissionalizantes. Além disso, uma cooperativa foi fundada para comercialização dos produtos criados pelos alunos, que dividiam a renda.
A escola atendeu cerca de 900 pessoas até o ano de 2006, e o projeto recebeu diversos prêmios pela sua excelência na área social, como o da Fundação Getulio Vargas e da Petrobras. Tirou Boa Vista de uma triste posição no mapa da violência. De 35 gangues, sobraram apenas cinco, como mostrou o estudo do Instituto Sangari, baseado em dados do Ministério da Justiça, e a violência juvenil teve redução de 72% entre 2001 e 2007, de acordo com informações da Polícia Militar de Roraima. Mas apesar dos bons resultados, o programa foi encerrado pela administração seguinte.
Em 2014 o projeto foi retomado pela nova gestão municipal de Teresa Surita. E com novos desafios: o enfrentamento ao problema do crack. A nova escola do Crescer funciona de segunda a sexta-feira e recebe diariamente cerca de 500 jovens em dois turnos. O projeto foi reconhecido pelo Ministério da Justiça como uma das iniciativas mais avançadas no enfrentamento à violência juvenil.
O Novo Crescer atende, atualmente, 500 jovens. Mas a meta é que, até 2016, 900 participem das oficinas de marcenaria, luteria, serralheria, metalurgia, moda, serigrafia, educação para o trânsito e sinalização, artesanato, música, dança, cinema e meio ambiente. Outras oficinas estão em implementação: cozinha regional e panificação, hip hop, informática, teatro e biojoias. Há, ainda, atividades esportivas como futebol de campo, vôlei e gincanas.